quinta-feira, 22 de abril de 2010

Romão Gramacho Falcão, sertanista

No grupo dos primeiros Gramachos da Bahia foi este o que deixou impressões mais fortes na história local, seja na toponímia seja no folclore.

É provável que tenha nascido por volta de 1710.

Foi certamente um aventureiro, caçador incansável de minérios nos sertões das Minas Gerais e da Bahia, tendo deixado inúmeros registros de sua passagem por aqueles rincões na rica tradição oral do povo baiano. O nome de Romão Gramacho aparece associado como precursor da fundação de várias cidades do interior de Minas Gerais e da Bahia, todas em áreas onde a mineração esteve na origem dos primeiros povoamentos. São os casos, além das citadas, de Itambé do Mato-Dentro, Morro do Chapéu, Jacobina, dentre outras. Romão Gramacho é, atualmente, nome de rua em várias cidades do interior baiano. Entretanto, o lugar mais importante a que seu nome está associado é o da Rio dos Brejões, ou Vereda “Romão Gramacho”, onde se situa um belíssimo parque natural com uma caverna que ostenta um pórtico de mais de 100 metros de altura, imensos salões formados na rocha natural em cujas paredes se pode encontrar inscrições rupestres de antigos habitantes da região. Trata-se de uma APA – Área de Proteção Ambiental sob controle do IBAMA, e fica próxima a cidade de Irecê.

Freqüentemente citado como fundador ou precursor da fundação de várias cidades nesses estados, em nenhuma dessas referências se menciona qualquer fonte documental. Essa condição, associado ao fato de ter entrado para o folclore baiano numa curiosa história envolvendo a construção de uma igreja, o colocavam, até aqui como um personagem lendário.

Afonso Costa atribuíu ao santamarense Sérgio Cardoso, num texto jornalístico de 1929, a divulgação de uma biografia do sertanista, na qual se afirma que Romão era filho de uma conceituada família do recôncavo da baía de Todos os Santos, de onde teria fugido ainda jovem levando consigo um escravo [1] . Teria regressado para a sua terra natal muitos anos depois, rico, para dedicar-se a construção de uma ou duas igrejas em Oliveira dos Campinhos, um distrito de Santo Amaro. Ali teria falecido no ano de 1772.

Os documentos do acervo do Arquivo Histórico Ultramarino, ainda que episódicos, nos permitem reconstituir melhor sua biografia e dar consistência ao personagem e fazer justiça à sua fama.

O primeiro registro que se refere à Romão data de 1738. Naquela altura, já Sargento-Mor, lhe foi emitida certidão de que apresentara ao Vice-Rei do Brasil, Conde de Galveas, os seus papéis de serviços até aquela data. Não seriam poucos, pois o documento menciona que estavam relacionados em nada menos que trinta e duas páginas.

Em 1743 apresenta requerimento dirigido ao Rei D. João V solicitando confirmação da patente no posto de Capitão do Sertão dos distritos de Itacambira, Rio Verde, Rio Pardo, Gorutuba e os que ficam entre estes e o Jequitinhonha.

Em 1767 está às voltas com negócios de salitre discutindo o preço com o comprador, Francisco Xavier de Mendonça, com a intervenção do Governador Geral da Província da Bahia, Conde de Azambuja que já não ostentava mais o título de Vice Rei pois a sede do reino havia sido transferida para o Rio de Janeiro em 1763. O comprador seria, provavelmente, Francisco Xavier de Mendonça Furtado que já havia ocupado o posto de Governador da Província do Grão-Pará e era irmão do Marques de Pombal, o todo poderoso ministro de D. José. Na época estava em Portugal, ocupando o Ministério da Secretaria de Estado. Vale a pena transcrever esse documento que revela a opinião do Conde sobre seu interlocutor ao resumir para o interessado o resultado das negociações.



“Ilustríssimo Capitão General

Falei com efeito a Romão Gramacho na forma do aviso de V.Excia. de julho do ano passado, sobre o salitre, assistindo também à conferência o Desembargador Intendente do Ouro. Lendo o dito Romão o que V. Excia. diz, respondeu que não teria dúvida em vender o quintal de salitre, nesta cidade, a dezoito mil réis, correndo as quebras por sua conta. Mas como isso passou de palavra, lhe disse, reduziu o mesmo que propunha a papel, o que ainda não fez por haver poucos dias depois da conferência. Mas também o mesmo Gramacho me requereu que nestes primeiros dois anos não podia fazer coisa nenhuma em razão de uma obra que traz entre as mãos que é uma capela que prometeu a Nossa Senhora, juntamente que necessitava de tratar isto também com os sócios que haviam de ser da mesma diligência.

O Intendente se lembrou de que nas Minas Gerais, principalmente para a banda do Serro do Frio, se tira salitre e se persuade que os homens de lá o poderão dar em melhor conta, pela facilidade da condução, porque como na estrada das Minas andam conduzindo cargas de fazenda tantos mil cavalos, esses, na torna viagem, poderão carregar o salitre com menos custo e também acham as estradas já abertas, o que por cá não há.

À vista disso lhe dei uma cópia da carta de V. Excia e das quebras que teve o salitre que daqui foi, para ele escrever para as Minas e poder nos homens de lá botar a conta à conveniência que lhe faz.

Assim, me parece será conveniente esperar pela resposta, pois além do que fica dito, como Romão Gramacho mete tanto tempo em meio e é já muito velho, poderá faltar-lhe a vida no meio da diligência e, por outra parte, ainda que respondeu o que acabo de referi, sempre me parece que lhe não ficou muito fixo nisto, e que o tempo que pede será talvez com o fim de intentar por outra parte algum requerimento, porque estes homens de Minas são todos muito espertos e sabichões, e o tal Romão Gramacho tem opinião de não ceder nessa parte a ninguém.

Bahia, 29 de março de 1767

Conde de Azambuja”



Não há duvida que esse documento traz algumas informações importantes para comprovar as informações do jornalista santamarense Sérgio Cardoso, acima citado. É ninguém menos que o Conde de Azambuja a relatar a avançada idade do sertanista, apesar de ainda hábil e esperto negociador, e seu compromisso de construir uma igreja. Como o encontro foi em Salvador é bastante provável que o idoso Romão vivesse nas proximidades, muito possivelmente, na sua Oliveira dos Campinhos cerca de 50 km de distância da capital.

A igreja de Oliveira dos Campinhos, cuja estrutura original o tempo arruinou, datava de 1718. Sua reconstrução consta ter sido iniciada no ano de 1768 e suas torres ligeiramente convergentes deram suporte à lenda de que foram produto de um violento coice do diabo quando se viu enganado pelo esperto Romão. Desde 1942 a igreja está tombada pelo IPHAN.

Interior da igreja de N. S. da Oliveira, em Campinhos, BA
(Foto do autor, 2004)
Lápide sobre o túmulo de Romão Gramacho Falcão
Igreja de N. S. da Oliveira, Campinhos, BA
(foto do autor, 2004)


Nota:
[1] Cf. Costa, Afonso “De como nasceu, se organizou e vive minha cidade (Jacobina)”, in Anais do IV Congresso de História Nacional, Vol. 9, pp. 181-384, IHGB, Rio de Janeiro, 1949

10 comentários:

  1. ele e meu nono avo!!!!!!!!!!!!!!! adorei a pesquisa.

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  2. Muito boa pesquisa! sou de Oliveira e já ouvi falar muito sobre ele.

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  3. Gostei da pesquisa e aprender um pouco sobre a origem da minha família.

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  4. Muito bom saber um pouco da historia de Oliveira minha avó, bisavó e Tataravó nasceram lá!

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  5. Tenho orgulho em carregar esse nome de tradição - Salve Romão Gramacho

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  6. Sou Genealogista aqui em Vitória da Conquista - Bahia, onde existe aqui descendentes do sargento-mor Romão Gramacho Falcão. De acordo com minhas pesquisas ele era natural da Vila de Caichoeira arcebispado da Bahia.Era filho legítimo do sargento-mor Antonio Mendez Falcão e Anna da Silva... Mais informações pelo meu e-mail: gleuber_ferreira@hotmail.com

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  7. Em jacobina se conta uma história onde Gramacho teria escondido um tesouro e que muitos passaram suas vidas tentando o encontrar e não o conseguiram.
    Acredito eu estar perto de uma evidência ligado à história onde o envolve. Tenho conhecimento de uma gruta com um suposto túmulo falso onde foi aberto e sua riquezas levadas a pouco tempo

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  8. Descobri que meu trisavô se chamava Alexandre Gramacho Sampaio, ele nasceu por volta de 1825 na Bahia. Estou desconfiado que ele seja descendente de Romão Gramacho Falcão. Por isso vou começar a pesquisar. Minha avó paterna era neta do Alexandre, e nasceu em Mundo Novo, bem próximo a Morro do Chapéu na Bahia.
    Abraço
    Ricardo de Almeida

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  9. Olá, fazendo pesquisas genealógicas em Ipirá - Bahia descobri que o avô de minha avó materna nascida em Mundo Novo se chamava Alexandre Gramacho Sampaio. Ele foi pai de meu bisavô JOVINO BASTOS SAMPAIO dono dá caso Anun em Ipirá. Sua filha Maria José Sampaio (minha avó) se casou em segundo matrimônio com meu avô Capitão Saturnino Ferreira de Almeida, o qual descende de Francisco Ferreira de Almeida, rico fazendeiro de São Gonçalo dos Campos, é este enterrado na igreja matriz dá cidade.


    Agora vou pesquisar este ramo dá família. Se alguém tiver mais informações sobre os Gramacho de São Bento, Mundo Novo, etc., Peço ajuda. Abraços a todos.
    Ricardo

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    1. Nasci em Itambe Do Mato Dentro,tem lendas e Historias por la.Trabalhei mais recente no Rio De Janeiro e,La tem rua,avenida e bairro com o nome de Romao Gramacho.Esse foi tropeiro/garimpeiro que seguia nos caminhos desbravados pelos Bandeirantes.

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